Considerações sobre o alcoolismo.
O alcoolismo é uma grave doença crônica, já catalogada (CID F10 –Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool), mas ela leva consigo um agravante: é confundida com desvio de caráter, pelo vulgo em geral e – pasmem! – por alguns médicos também. Pela minha observação, o desvio de caráter pode vir, às vezes até como um mecanismo de defesa do dependente, num patamar mais avançado da doença, quando o alcoólico passa a mentir, a negar que bebeu, a dirigir alcoolizado arriscando sua própria vida e a de outros, a comprometer suas responsabilidades familiares e profissionais…
Mesmo grave, sendo compreendida com uma dose de paciência e solidariedade familiar é possível ser controlada, através: a.) dos desvios dos gatilhos que levavam a beber. Um desses desvios de gatilhos é pela prática do exercício físico que o familiar deverá se determinar pacientemente a acompanhá-lo, embora no início vá perceber sua resistência em ir; b.) do convencimento em frequentar, também como companheiro solidário, os Alcoólicos Anônimos (AA), essa formidável entidade sem qualquer outro objetivo a não ser a recuperação dos alcoólicos.
Ao escrever no parágrafo anterior que a doença é possível de ser controlada mostrando o caminho, ouvi também em reunião dos AA depoimentos de vários alcoólicos em recuperação que estavam no fundo do poço e já há 30 (trinta!) anos não bebiam. Mesmo sabendo do risco que corriam – não me pareciam ingênuos absolutamente– consideravam que sua dignidade, sua saúde e suas finanças estavam finalmente recuperadas. E como era emocionante vê-los contar para nós, estranhos, com seriedade e franco desprendimento, suas tristíssimas histórias passadas e, com júbilo claro em seus olhares, as posteriores bem-aventuradas já de recuperação. Confesso que quando cheguei em casa, rezei por eles todos, ainda emocionado, sem entender a razão de um suposto eventual estigma dessa entidade tão merecedora de consideração e respeito.
A minha profunda admiração, primeiro, aos que, com esperança e determinação, conseguem força para a recuperação e, segundo, aos que, com solidariedade e paciência, se dispõem a acompanhar pessoas acometidas por esse mal, já pesado por si só, e mais o agravante que carrega: a errônea, ignorante e perversa ideia de que seria um desvio de caráter.
(Esse texto é dedicado também à dra. Erlane, quem primeiro levou a um centro dos AA a pessoa para quem, com todo o meu amor, escrevo essas considerações, e à Gilda que tomou para si a continuação do generoso gesto da Erlane).