sábado, 5 de fevereiro de 2022

Minha mãe e seu autor preferido


Minha mãe e seu autor preferido. 

Minha mãe era uma ávida leitora de jornal. Não me lembro de tê-la visto lendo muitos livros, mas dois autores me fazem lembrar dela: o francês Gustave Flaubert – ela tinha uma edição de Madame Bovary num livro estreito e comprido cuja capa era de veludo cor de vinho, já muito estragada que tive de mandar reencadernar e reli nesta versão impressa em março de 1959 nas oficinas da Edições Alarico Ltda.; e o austríaco Stefan Zweig cuja obra ela tinha completa. Tanto o livro de Flaubert quanto a coleção de Zweig, eu trouxe aqui pra casa. 

Autor que ela amava, austríaco de origem judaica que fugindo do nazismo passou pelo Brasil, se apaixonou e acabou ficando. Foi morar em Petrópolis, onde, em 1942, deprimido com as notícias dos avanços alemães na guerra, ele e a mulher decidiram dar fim às próprias vidas. 

Lembro que mamãe lia seus livros e emprestava para a tia Alazi, mãe da Alania. Cheguei a ouvir as duas comentando a leitura de um ou outro livro. Por ouvi-las e porque há um livro dele que se chama Três Novelas Femininas é que eu, adolescente,  achava que Zweig era um autor de assuntos de mulher. Desde o começo da pandemia, li com muito interesse as “Três Novelas Femininas”, “Brasil, país do futuro”, e os ensaios sobre Freud, Tolstói e Nietzsche. 

Gilda está lendo a biografia de Maria Antonieta, a austríaca rainha da França, casada com o rei Luis XVI, e acaba de me contar que eles tiveram dois filhos e duas filhas, a última, que viveu apenas 11 meses se chamava Sofia Beatriz, nome de uma de minhas irmãs. 

Mamãe deu nomes compostos até o quarto filho: João Luiz, Sofia Beatriz, Carlos Henrique e Dante Junior; e a partir do quinto, nomes simples: Denise, Ricardo, Leonardo, Monica, e Alexandre. Sempre observei essa mudança em seu critério nas escolhas de nossos nomes, mas nunca soube a razão. Entretanto, combinar os nomes compostos é mais trabalhoso. Imagino que foi o que a fez mudar de critério.

O meu nome, ela me disse que tirou de uma lista de engenheiros formandos da turma de 1953. João Luiz tem o nome dos nossos dois avôs, João, o paterno, e Luiz, o materno, que eram irmãos. Dante Junior é óbvio, e Sofia Beatriz, eu nunca soube, e agora cheguei a pensar que tinha sido inspirado pela leitura da biografia de Maria Antonieta, escrita por Zweig, mas conversando com minha irmã, ela tem outra versão: Sofia foi o nome de uma freira, colega de Ritinha, irmã caçula de minha mãe, também freira, que sugeriu, e minha mãe acrescentou Beatriz, personagem de Dante Alighieri. Homenagem indireta ao meu pai?

A propósito deste autor preferido de minha mãe, Stefan Zweig, seu ótimo livro sobre o Brasil é notável pelo título que virou um verdadeiro estigma para nós: Brasil, (eterno) país do futuro.

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